O exército birmanês disparou este domingo contra vários manifestantes com munições reais em Bagan, a cidade histórica na área central de Myanmar, causando um ferido leve, segundo os organizadores do protesto.
Milhares de birmaneses voltaram às ruas para protestar contra a junta militar em várias cidades, como Mandalay e Rangum, onde as forças de segurança dispararam gás lacrimogéneo.
Vestidos com capacetes de plástico e escudos de metal, os manifestantes tentavam impedir o avanço da polícia e dos militares com barricadas nas ruas, apesar da dura repressão. Fontes da Liga Nacional para a Democracia, partido do líder de facto Aung San Suu Kyi, relataram na rede social Facebook que um de seus representantes em Rangum, a maior cidade do país, morreu após ser preso no dia anterior. As mesmas fontes não especificaram o motivo da morte.
Pelo menos 54 manifestantes, incluindo cinco menores, morreram e centenas ficaram feridos devido a tiros de polícias e soldados durante os protestos, contra o golpe de 01 de fevereiro, que se repetem diariamente em todo o país. Além disso, mais de 1.500 pessoas, incluindo políticos, ativistas, jornalistas e monges, foram detidas desde o golpe militar e mais de 1.200 continuam presas, incluindo Suu Kyi, de 75 anos, que está incomunicável em prisão domiciliária.
A junta militar continua com uma campanha de desinformação nos media oficiais, na qual insiste que houve fraude eleitoral nas eleições de novembro passado, embora estas tenham sido validadas por observadores internacionais, e no desempenho correto das forças de segurança.
Os militares cortaram o acesso à Internet todas as noites durante semanas, como parte das medidas repressivas contra a população, que lançaram um movimento de desobediência civil contra o golpe.
Dias depois do levante militar, durante o qual parte do Governo eleito de Suu Kyi foi preso, a junta militar cortou o acesso a redes sociais como Facebook e Twitter para impedir que os cidadãos organizassem e compartilhassem vídeos, mas muitos contornam o bloqueio por meio de VPN.
Os manifestantes exigem que o exército liberte os presos, permita o retorno à democracia e reconheça o resultado das eleições de novembro passado, nas quais a Liga Nacional para a Democracia foi a vencedora.
Austrália suspende cooperação militar
A Austrália anunciou a suspensão da cooperação militar com Myanmar, em resposta ao golpe de Estado de 01 de fevereiro e à repressão dos protestos que causou mais de 50 mortos.
O Governo australiano apelou ainda à libertação da líder deposta, Aung San Suu Kyi, e do seu conselheiro australiano.
A ministra australiana dos Negócios Estrangeiros, Marise Payne, afirmou em comunicado, no domingo, que a cooperação militar com Myanmar era “limitada” e abrangia “áreas que não são de combate, como a formação em língua inglesa”.
A ministra informou também que o programa de desenvolvimento australiano será canalizado para as organizações não-governamentais (ONG), excluindo as agências governamentais, para dar prioridade à entrega de ajuda humanitária às pessoas mais vulneráveis, incluindo os mais pobres e a minoria étnica dos rohingya.
Payne disse também que o Governo cambojano irá rever o seu regime de sanções contra Myanmar, que já inclui um embargo à venda de armas e sanções contra a junta militar que tomou o poder.
A ministra insistiu na “libertação imediata” de Suu Kyi, que foi detida pelos militares no início de fevereiro, bem como do seu conselheiro para os assuntos económicos, o australiano Sean Turnell.
“O professor australiano Sean Turnell [diretor do Instituto de Desenvolvimento de Myanmar desde 2017] foi detido com acesso consular limitado durante mais de 30 dias”, especificou o ministro, condenando o uso de violência letal contra civis.
ONG denuncia ocupação de hospitais pela força
Os militares birmaneses, que assumiram o controlo de Myanmar após o golpe de Estado, ocuparam à força pelo menos seis hospitais, denunciou uma organização não-governamental (ONG).
A ONG Médicos para os Direitos Humanos alega que os soldados invadiram meia dúzia de hospitais em Rangum e ocuparam outros centros de saúde em Mandalay, Monywa e Taunggyi.
A ocupação de hospitais é uma violação do direito internacional e “apenas serve para minar ainda mais um sistema de saúde já sitiado pela pandemia da covid-19”, escreveu a ONG em comunicado.
“Embora o pessoal médico tenha deixado os seus postos para iniciar o movimento de desobediência civil, muitos voltaram aos hospitais em resposta à escalada da violência contra manifestantes pacíficos”, disse uma epidemiologista do Centro de Saúde Pública e Direitos Humanos da Universidade Johns Hopkins, Sandra Mon.
“Este cerco aos hospitais segue-se a vários dias de baixas e ferimentos em civis, significativos, e pode ser interpretado como uma tentativa direta de impedir as pessoas de aceder aos cuidados médicos. É também uma ameaça para os médicos deixarem de tratar os manifestantes feridos”, acrescentou.
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