Maria Crocifissa della Concezione nasceu Isabella Tomassi em algum
dia e mês que não se sabe em 1645. Os escassos registros acerca da vida
da freira apontam que ela ingressou aos 15 anos em um convento
beneditino, na cidade siciliana de Palma di Montechiaro, que fica na
província de Agrigento (Itália).
A ordem beneditina, por tradição,
ensina trabalho, paz e oração. As freiras costumam sempre estar em
comunhão e realizar vigílias intermináveis em prol do mundo e das almas
desgarradas que vagam pela Terra. A Irmã Maria era conhecida como uma
freira muito devota, porém desde a mais tenra idade travava consigo uma
batalha constante em defesa de sua paz. Inclusive, um dos principais
motivos que teria feito a jovem entrar para o convento foi justamente a
tentativa de se livrar de uma voz que a atormentava.
A voz infernal
(Fonte: Quora/Reprodução)
A
princípio, nenhuma das irmãs notou nada de muito diferente no
comportamento da noviça, porém, com o passar do tempo, a luta interna
dela começou a transparecer de uma maneira angustiante. Quando
interrogada, ela confessou que estava sendo visitada pelo Diabo.
As
freiras se comoveram, ainda mais por se tratar de alguém tão jovem,
porém não ficaram surpresas. Boa parte delas já havia sido tentada por
meio de vozes maliciosas que queriam demovê-las de seu ofício sagrado,
fosse com relação a entrar no convento ou durante as muitas horas de
vigília. O único remédio para o tormento era a oração, e foi isso que
elas sugeriram à Irmã Maria fazer, mantendo-se firme no diálogo com Deus
e rejeitando veementemente qualquer voz que incitasse tentação.
No
entanto, após anos de luta, a Irmã Maria não conseguiu manter longe "a
presença diabólica" que a atormentava. No dia 11 de agosto de 1676, aos
seus 31 anos, a freira foi encontrada com o rosto manchado de tinta e um
pedaço de papel na mão, em uma espécie de surto, no chão de sua cela no
convento. Imediatamente, a mulher foi acudida pelas outras irmãs, e foi
a Madre Superiora quem teve o primeiro contato com o papel que a freira
tinha em mãos.
Assim que se recuperou, Irmã Maria explicou que
aquilo se tratava de uma carta ditada pelo próprio Lúcifer durante um
momento em que ela acredita ter sido possuída por ele. Nenhuma das
freiras conseguiu ler, tampouco entender o que se tratavam as 14 linhas
de símbolos e letras de um alfabeto arcaico, descritas de modo
ininteligível. A própria Irmã Maria também foi incapaz de dizer do que
se tratava, pois, segundo ela, a voz teria dito que aquela mensagem não
era destinada a nenhuma delas.
Entretanto, toda aquela perseguição
também fazia parte de um plano para convertê-la ao lado das trevas,
para que a mulher pudesse se tornar uma espécie de "emissária do mal".
Desvendando um mistério
(Fonte: Daily Magazine News/Reprodução)
Ao
longo dos 342 anos do ocorrido, a carta praticamente adquiriu o caráter
de uma lenda urbana, como tudo que apresenta um "teor maligno". Com a
ascensão da internet, a mensagem rapidamente se disseminou entre os
fóruns online, até que o tempo tomou conta de reacender o interesse
público.
Os pesquisadores do museu Ludum, na Itália, decidiram que
desvendariam o segredo da mensagem de uma vez por todas. Com o auxílio
de um programa de decodificação encontrado na deep web
e usado por redes de sistema de inteligência internacional, o software
detectou a presença de palavras em grego, árabe, rúnico e latim.
Daniele
Abate, diretor do Museu Ludum, acredita que a Irmã Maria teria escrito a
carta em um sistema de taquigrafia – um método abreviado ou simbólico
de escrita –, usando um novo vocabulário ou extraindo as letras de
alfabetos antigos que ela podia ter conhecido. Eles tiveram a certeza
disso após testarem o software em alguns símbolos taquigráficos padrão
em diferente idiomas.
Em nenhum momento, a equipe alimentou
expectativas em relação ao resultado, principalmente por suspeitarem que
a freira não apresentava um perfil psicológico tão equilibrado, muito
embora não existissem diagnósticos de sua saúde mental em local algum
nos documentos que foram encontrados sobre o seu passado. No entanto, o
fim do mistério se tornou uma questão histórica para todos eles.
Sendo
assim, os pesquisadores ficaram surpresos quando a mensagem da carta
fazia mais sentido do que esperavam. A freira tinha um bom domínio das
línguas, e o que escreveu parecia até muito coerente para ter sido fruto
de um surto psicótico, como muitos alegavam.
(Fonte: My New Desk/Reprodução)
A
mensagem da carta se refere a Deus, ao Espírito Santo e a Jesus como
"pesos mortos" e reforça: “Deus pensa que pode libertar os mortais... O
sistema não funciona para ninguém... Talvez agora Estige esteja certo”.
Na
mitologia grega e romana, Estige é lido como o rio do Tártaro. Em um
contexto dionisíaco, falando sobre vingança, o rio flerta com a Divina Comédia
de Dante Alighieri, na qual é proposto que o Estige é um rio de almas
formado por aqueles que foram condenados pelo pecado da ira.
Em
uma análise, Daniele Abate interpretou essa ira e revolta toda da freira
como uma espécie de reflexão interna sobre a própria luta contra "os
espíritos malignos" que tentaram controlá-la durante toda a sua vida. Em
um viés científico, isso poderia ser o traço de um transtorno de
bipolaridade.
De acordo com a abadessa Maria Serafica, o Vaticano
enxergou o episódio como uma clara luta de uma freira que tentou ser
subjugada pelo mal, sendo testada até o seu último dia, e resistiu a
isso apesar de tudo. Serafica explicou o único detalhe que os
pesquisadores do Museu Ludum não conseguiram identificar: a abadessa
disse que a palavra Ohimé (Oh eu) se trata da assinatura da Irmã Maria, que teria contrariado as ordens do Diabo de assinar a carta com o próprio nome.
O
mistério encontrou parte do seu fim na explicação científica, porém o
seu teor conspiratório se mantém no ar. A Igreja, inclusive, considerou a
freira uma vitoriosa e a estimou dignamente, porém não o suficiente
para canonizá-la.
https://www.megacurioso.com.br/misterios/114488-a-carta-escrita-pelo-diabo.htm
Sem comentários:
Enviar um comentário