Na tentativa de evitar a disseminação de doenças como a
malária e a cólera, a Cidade do México enterrou os seus rios. Agora,
como consequência, criou inadvertidamente as condições necessárias para a
covid-19 prosperar.
A Cidade do México é uma bacia de poeira, uma megametrópole poluída
onde respirar é difícil. Mesmo antes da pandemia do covid-19 começar a
invadir a capital mexicana, os moradores usavam máscaras regularmente
durante as frequentes emergências de qualidade do ar.
Agora, a séria poluição do ar da Cidade do México –
que contribui para altas taxas de doenças respiratórias e
cardiovasculares – está a tornar os 21 milhões de habitantes da região
metropolitana mais vulneráveis ao coronavírus.
A Cidade do México nem sempre foi um desastre ecológico e sanitário.
Como o centro do império asteca, era verdejante e diversificada. No
final do século XX, 45 rios corriam pela capital mexicana.
A decisão de enterrar e pavimentar os seus rios,
criando a metrópole árida de hoje, foi um plano do século XX destinado a
proteger os moradores de doenças – especificamente cólera, malária e
outras doenças transmitidas pela água, causadas por inundações
frequentes.
A relação entre a sua geografia, história e situação sanitária é
relevante hoje, enquanto a cidade luta com o seu mais recente surto de
doença. A cidade foi construída no meio da água através de “chinampas” – pequenas parcelas de lago cheias de detritos, cerâmica e solo para criar terra sólida, com canais a fluírem ao seu redor.
Tal como Veneza, a cidade tinha os mesmo problemas de saúde,
incluindo água contaminada, mosquitos e cheiros desagradáveis. No
entanto, os astecas geriram bem a cidade e evitavam inundações.
Esta boa gestão urbana terminou com a conquista espanhola em 1521.
Tenochtitlán (o antigo nome da Cidade do México) foi destruída, com os
seus palácios e calçadas a transformaram-se em escombros no fundo do
lago. Os espanhóis não entendiam a ecologia da área, nem entendiam ou
respeitavam a engenharia asteca. Para reconstruir a sua capital, eles
drenaram o lago.
Essa estratégia levou a tremendas inundações. Em
1629, a pior enchente da história da Cidade do México durou cinco anos e
matou mais de 30.000 pessoas devido a afogamentos e doenças.
A estação chuvosa transformou partes da cidade em fossas, fazendo com
que doenças como cólera, meningite e malária proliferassem. As doenças gastrointestinais também surgiram, uma vez que os moradores usaram os rios da Cidade do México para despejar lixo e esgoto.
O México conquistou a independência da Espanha em 1810. Para lidar de
uma vez por todas com os seus problemas de inundações, os líderes da
cidade decidiram, na década de 1890, canalizar chuvas, inundações e
esgotos para fora da cidade através de um canal de drenagem.
Já em meados do século XX, para evitar inundações, doenças e morte, a Cidade do México decidiu enterrar os seus rios poluídos.
Hoje, esses rios são visíveis apenas nos nomes das ruas que correm
sobre eles: Avenida Rio Mixcoac, Avenida Rio Churubusco, entre e outras.
No entanto, sem os seus rios, a Cidade do México secou e ficou
empoeirada. E por causa da sua geografia, a poeira não conseguiu
escapar.
A partir da década de 80, o número de carros cresceu para milhões,
aumentando ainda mais a poluição. Hoje, a Cidade do México é conhecida
pela sua poluição atmosférica e pelas terríveis consequências para a saúde trazidas pela poluição, incluindo asma e doenças cardíacas.
O surto de coronavírus não foi causado pelo ar poluído, mas a má qualidade do ar da cidade – juntamente com a sobrelotação e outros fatores relacionados com a pobreza – cria as condições para que a covid-19 faça adoecer e mate mais pessoas.
Ao tentar eliminar doenças transmitidas pela água, a capital mexicana
acabou por ajudar um vírus transmitido por via aérea a encontrar mais
hospedeiros.
https://zap.aeiou.pt/cidade-mexico-covid-19-prospera-333261
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