Em 15 de agosto de 1945, o Japão se rendeu
aos Aliados e colocou um fim na Segunda Guerra Mundial. A partir disso, o
país experimentou o início das consequências arrasadoras do conflito,
como a destruição causada pela bomba atômica e o declínio econômico. Em
adição a isso, para desespero do governo, ocorreu um enorme aumento na
taxa de natalidade.
Na época, o Japão tinha uma população de 72,2
milhões de pessoas, depois de perder 2,3 milhões de militares em
conflitos que aconteceram entre 1930 e 1940. Com a volta dos homens que
sobreviveram à guerra, o desejo de constituir uma família e seguir a
vida resultou no nascimento de 2,6 milhões de bebês entre 1947 e 1949.
O
governo pós-guerra teve que recorrer ao controle de natalidade para
retardar o crescimento populacional o mais rápido possível, visto que já
havia se tornado um problema de ordem pública. A Lei Farmacêutica só
foi homologada em 1949, e o Conselho de Ministros desenvolveu políticas
fundamentais para popularizar o controle de natalidade em todo o país
apenas em 29 de outubro de 1951.
Nesse ínterim, à sombra desse
fenômeno social, alguém se viu forçado a fazer o controle de natalidade
com as próprias mãos, antes que fosse tarde demais para a já devastada
Terra do Sol Nascente.
Miyuki, a parteira
Em
meados de 1897, Miyuki Ishikawa nasceu na pequena cidade de Kunitomi,
localizada na província de Miyazaki, no sul japonês. Ela se formou na
Universidade de Tóquio e se casou com Takeshi Ishikawa, com quem nunca
teve filhos. Por anos, ela dirigiu uma das alas do Hospital Maternidade
Kobotuki e era conhecida por ser uma excelente parteira, além de muito
experiente.
Fora esses detalhes básicos, quase nada se sabe sobre a
vida pregressa ou íntima de Ishikawa, somente as suas convicções. Ela
não se considerava uma mulher ruim, apenas uma cidadã que fez o que era
necessário para o bem da nação, apesar de tudo. A mulher via o que
acontecia todos os dias em seu trabalho, com cada vez mais mulheres
dando à luz em uma realidade socioeconômica catastrófica. Ela sabia que,
se o país continuasse naquele compasso, não haveria lugar ou comida
suficiente para milhares de pessoas em alguns anos, tampouco para as
gerações futuras.
De acordo com Ishikawa, ironicamente, os casais
sabiam que não teriam dinheiro para alimentar os próprios filhos, porém
era maior a necessidade de estabelecer laços que afastassem os fantasmas
do pós-guerra. Sem nenhum serviço social ou de caridade para reverter
aquela situação, ela chegou à conclusão de que a solução era assassinar
os recém-nascidos, visto que a perda deles seria irrelevante e
contribuiria para que ninguém vivesse em miséria, doença e sofrimento.
O esquema assassino
Naquela
época, abortos eram ilegais nos país, e qualquer atitude para tentar
interromper uma gravidez era punida com severidade, apesar disso, o
"negócio" que Ishikawa fundou não era muito secreto; inclusive, muitas
parteiras acabaram se demitindo por não concordarem com a nova política.
Ainda assim, ninguém fez nada para detê-la.
Foi persuadindo os
pais pobres e desesperados que chegavam aos seus cuidados que a mulher
começou a implementar as práticas. Ishikawa chamou o marido para cuidar
da parte financeira, pois ela cobrava uma fortuna para realizar o
trabalho, alegando que o casal gastaria mais com despesas de longo prazo
se tivesse o filho. O médico Shiro Nakayama também entrou no negócio, e
ficou responsável pela falsificação de certidões de óbito dos
recém-nascidos.
A mulher deixaria que as crianças morressem de fome ou de tanto chorar para que a palavra assassinato passasse longe da causa da morte se algum legista curioso quisesse inspecionar.
A mudança de uma nação
Em
12 de janeiro de 1948, policiais de Waseda encontraram os restos
mortais de cinco bebês. A autópsia não conseguiu definir a causa da
morte, porém as circunstâncias nas quais foram encontrados não apontava
uma morte natural. Em uma investigação mais aprofundada, foram
encontrados na casa de um agente funerário mais 40 cadáveres. Mais
tarde, outros 30 corpos foram escavados do terreno de um templo.
Através
de testemunhas e declarações de alguns casais que as autoridades
conseguiram rastrear, Miyuki Ishikawa foi presa com seus comparsas em 15
de janeiro daquele ano. A mulher culpou os pais pela morte das crianças
e teve o total apoio da opinião pública, muito embora a fala fosse
discriminatória. O Tribunal Distrital de Tóquio a acusou de crime de
omissão em vez de assassinato, e ela foi condenada a apenas 8 anos de
prisão, enquanto os cúmplices receberam 4 anos cada.
Em 1952, o
casal recorreu da decisão, e o Supremo Tribunal de Tóquio revogou a
sentença original e condenou Miyuki a 4 anos de encarceramento e
Takeshi, a 2 anos.
O caso levou o governo japonês a encarar o
aborto como uma questão de saúde pública, principalmente para mulheres
em situação de risco e pobreza, por isso a prática foi legalizada em 24
de junho de 1949.
A Lei Farmacêutica ajudou a embasar essa
decisão não apenas através da distribuição de preservativos mas também
do preparo de profissionais de saúde (parteiras e enfermeiras) para
educar homens e mulheres sobre as práticas de contracepção, fundamentais
para o controle de natalidade. Com ajuda do governo central e de
autoridades locais, seminários de instrutores, visitas periódicas e
aconselhamento matrimonial foram realizados em todas as esferas sociais.
Apesar
de não ter pagado pelos seus crimes de uma maneira justa devido ao
contexto judicial no qual a sua história foi inserida, Ishikawa ainda é
considerada a mais prolífica assassina em série da história do Japão.
https://www.megacurioso.com.br/misterios/115070-miyuki-ishikawa-a-exterminadora-que-mudou-o-japao.htm
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