Vladimir Putin anunciou a realização de manobras de forças nucleares da Rússia, com o disparo de mísseis balísticos e de cruzeiro, durante este fim de semana, com o apoio da Bielorrússia.
Recorde-se que Alexander Lukashenko, presidente da Bielorrússia, afirmou na quinta-feira que o país está pronto para receber armas nucleares russas para se defender.
As manobras vão envolver efectivos na região militar do sul da Rússia e também forças aeroespaciais, unidades estratégicas e frotas presentes no Mar do Norte e no Mar Negro para testarem a “fiabilidade das armas estratégicas nucleares e não nucleares” de Moscovo.
Este anúncio parece assim vir confirmar as acusações da NATO, que afirmou que o comunicado do Kremlin sobre a retirada de tropas da fronteira com a Ucrânia não era verdadeiro.
Tensão aumenta nas regiões separatistas
Um soldado ucraniano foi hoje morto em confrontos com os separatistas apoiados por Moscovo no leste do país, anunciou o exército da Ucrânia, elevando os temores de uma invasão russa.
“Na sequência de um bombardeamento, um soldado ucraniano foi mortalmente ferido”, afirmou o comando militar para o leste da Ucrânia.
As forças armadas ucranianas afirmam, no entanto, em comunicado, que “controlam a situação” e “continuam a sua missão de repelir a agressão armada russa”.
A Presidência ucraniana anunciou, entretanto, que o Presidente, Volodymyr Zelensky, vai manter a sua deslocação de hoje a Munique, apesar do risco de um ataque russo.
A situação no leste do país “está plenamente sob controlo“, disse a Presidência, sem fazer referência a declarações do Presidente norte-americano, Joe Biden, que na sexta-feira questionou a oportunidade de o chefe de Estado ucraniano sair do país nas circunstâncias atuais.
Os separatistas da região de Donetsk, que acusam Kiev de querer retomar o controlo da região, qualificam de “crítica” a situação e anunciaram uma mobilização geral.
Os observadores internacionais da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE) informaram também na sexta-feira que as violações do cessar-fogo na região oriental ucraniana de Donbas registaram um “aumento significativo”.
A OSCE registou 222 violações de cessar-fogo na área de Donetsk, das quais 135 foram explosões. Já em Luhansk foram verificadas 648 violações, das quais 519 foram explosões, disse a OSCE num relatório.
Estes números refletem um aumento significativo da violência armada na Ucrânia oriental, concluiu a organização, reiterando “a necessidade” de se abster do uso da força e de desescalar uma situação “já tensa”.
“A retórica cada vez mais hostil e inflamatória que temos ouvido recentemente mina os esforços de promoção da paz, estabilidade e segurança e aumenta o risco de novos confrontos e escalada. Tem de parar”, sustentou na mesma nota.
Entretanto, milhares de pessoas foram deslocadas das regiões de Lugansk e Donetsk para a região russa de Rostov, no leste do país.
Esta escala de tensão nas regiões separatistas surge na mesma altura em que Joe Biden voltou a dizer que está “convencido” de que o Presidente da Rússia, Vladimir Putin, decidiu avançar com um ataque à Ucrânia “nos próximos dias”, incluindo à capital Kiev.
“Estou convencido de que [Putin] tomou a decisão. Temos motivos para acreditar que sim”, referiu o chefe de Estado norte-americano durante uma declaração na Casa Branca, acrescentando que o ataque russo à vizinha Ucrânia poderá ocorrer “nos próximos dias”.
Joe Biden salientou, no entanto, que enquanto não ocorrer uma invasão “a diplomacia é sempre uma possibilidade” e revelou que o chefe da diplomacia norte-americana, Antony Blinken, vai encontrar-se quinta-feira, na Europa, com o homólogo russo, Sergey Lavrov.
Sanções da UE incluem controlos às exportações
O pacote de sanções que a União Europeia está a preparar contra a Rússia caso Moscovo invada a Ucrânia prevê um mecanismo de controlo às exportações. Esta sanção é frequentemente utilizada pelos Estados Unidos, mas a UE nunca a usou devido à dificuldade de consenso entre os estados-membros sobre os produtos ou sectores que devem ser incluídos, escreve o Público.
Uma fonte europeia garante ao jornal que os 27 já concordaram com a proposta e que estão dispostos a “ir tão longe quanto possível” para travar a Rússia. Estão ainda em cima da mesa sanções contra a Bielorrússia, caso Minsk apoie uma eventual invasão. O pacote foi feito em acordo com os EUA, Canadá, Reino Unido, Japão, Coreia do Sul e Suíça e já define que indivíduos e entidades estão em causa.
Ainda não são conhecidos muitos detalhes porque o pacote final ainda não foi aprovado, mas sabe-se que as sanções vão abranger os sectores económico, financeiro e energético. Os 27 também não adiantam mais informações porque isso eliminaria o factor surpresa e daria tempo a Moscovo para mitigar os efeitos.
A UE está ainda a tentar antecipar possíveis retaliações da Rússia e a preparar medidas compensatórias para os estados-membros que dependem mais do comércio com o país.
Moscovo estará a estudar as maiores fragilidades do bloco europeu, nomeadamente a cibersegurança, as campanhas de desinformação e aquela que é a mais óbvia — a dependência no fornecimento de gás natural.
Recorde-se que a construção do gasoduto Nord Stream 2, que liga a Alemanha à Rússia, tem sido um dos pontos de contenção neste conflito e a recusa alemã de enviar armamento para Kiev devido aos acordos energéticos com Moscovo valeu-lhe muitas críticas. Após a reunião com o chanceler alemão Olaf Scholz, Joe Biden já veio dizer que a obra não vai avançar caso haja uma invasão.
Representante ucraniana na Eurovisão afastada por ter visitado a Crimeia
Entretanto, o conflito russo-ucraniano está também a ter repercussões fora da política. A artista ucraniana Alina Pash venceu a competição Vidbir, que é o equivalente ao Festival da Canção em Portugal, e tinha sido escolhida para representar o país no palco da Eurovisão, que vai ter lugar em Turim, em Maio.
No entanto, a cantora foi afastada porque em 2015, já depois da anexação russa do território, Alina foi à península da Crimeia, alegadamente entrando através da Rússia. A lei proíbe estas deslocações, permitindo apenas que os cidadãos ucranianos e estrangeiros só entrem na Crimeia através da sua própria fronteira e quem entrar através da Rússia fica impedido de entrar na Ucrânia.
Alina Pash confirmou que esteve na Crimeia, mas garantiu que não entrou pela fronteira russa e terá mostrado documentos para o provar. Contudo, as autoridades não confirmaram a legalidade dos documentos e a especulação continuou.
Perante este cenário, a artista anunciou que vai sair da competição, sublinhando que é uma artista e “não um político”.
Esta não é a primeira vez que o conflito na Crimeia chega ao palco da Eurovisão, apesar da competição se afirmar como apolítica. Em 2016, a Ucrânia venceu o concurso com a canção 1944, interpretada por Jamala, que relatava a história da deportação dos Tártaros da região durante a governação de Estaline.
A entrada foi polémica, com muitos russos a questionarem a sua legalidade por ter uma mensagem política, especialmente no contexto da reignição do conflito na península em 2014. A tensão entre os dois países foi ainda mais óbvia porque nesse ano a Rússia venceu o televoto, com a música “You Are The Only One” interpretada por Sergey Lazarev, tendo o país ficado no terceiro lugar.
Por ter vencido em 2016, a Ucrânia organizou o concurso em 2017 e a representante russa, Yulia Samoylova, foi também impedida de entrar no país pelas mesmas razões de Alina — ter desrepeitado a lei ucraniana ao entrar da Crimeia através da Rússia. Moscovo acabou por decidir não participar no festival nesse ano.
Em 2019, a vencedora do Vidbid também abandonou a representação ucraniana no palco europeu por questões políticas. Anna Korsun, cujo nome de palco é Maruv, depois do seu patriotismo ter sido questionado.
Jamala, a vencedora de 2016, estava no painel de jurados e decidiu fazer questões aos candidatos fingindo ser uma jornalista em Tel Aviv, onde a Eurovisão foi organizada em 2019 e perguntou a Maruv se “a Crimeia é da Ucrânia?“. A cantora respondeu que sim, mas o tom da sua resposta foi posto em causa, levando ao seu afastamento. O país acabou assim por não participar no festival em 2019.
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