A variante britânica do SARS-CoV-2, presente em 29 países da
União Europeia, é responsável por mais de metade das infeções totais. A
estirpe detetada no Brasil, apesar de pouco prevalecente na Europa, pode
ter uma carga viral até dez vezes mais elevada do que o vírus original e
é capaz de iludir o sistema imunitário.
A variante britânica do SARS-CoV-2 estava, até há uma semana,
presente em 29 países da União Europeia (UE) e Espaço Económico Europeu
(EEE), num total de 10.700 casos, sendo agora responsável por mais de metade das infeções totais.
A informação é avançada à agência Lusa pelo Centro Europeu
de Prevenção e Controlo das Doenças (ECDC, na sigla inglesa), que indica
que, até 22 de fevereiro, “foram identificados cerca de 10.700 casos em
29 países da UE/EEE” da mutação inicialmente detetada no Reino Unido em
novembro passado.
“A variação está a aumentar em toda a região [na Europa] e estima-se
que seja agora responsável por mais de 50% de todos os casos na maioria
dos Estados-membros”, acrescenta a agência europeia em resposta escrita
enviada à Lusa.
Aludindo às evidências científicas, o ECDC assinala que esta variação (que é a que está mais presente a nível europeu) é também “mais transmissível” que o vírus original, o que pode ter “implicações sobre a eficácia das medidas”.
“É provável que conduza a uma maior gravidade da doença
e, portanto, as taxas de internamento podem aumentar”, acrescenta este
centro europeu, que presta apoio aos Estados-membros em crises
sanitárias como a atual pandemia.
No que toca à variante detetada na África do Sul, também até 22 de fevereiro, tinham sido “identificados cerca de 650 casos em 15 países da UE/EEE”, de acordo com o ECDC.
Este centro europeu observa que se registou “transmissão comunitária
em alguns surtos comunicados por alguns Estados-membros” e que esta
mutação do SARS-CoV-2 registada na África do Sul “é suscetível de ter um
impacto significativo na eficácia da vacina para, pelo menos, algumas
das vacinas atualmente aprovadas”.
Já no que toca à variante brasileira, detetada em viajantes do
Brasil, até 22 de fevereiro, tinham sido “identificados cerca de 50
casos em oito países da UE/EEE”.
Num relatório divulgado em meados de fevereiro, o ECDC já tinha
avisado que, apesar da redução da incidência do SARS-CoV-2 nas últimas
semanas, a situação epidemiológica “ainda é motivo de grande
preocupação” na Europa, pelo que apelou a intervenções de saúde pública
“imediatas”.
Na altura, os peritos da agência europeia de saúde pública indicaram
que as novas e mais contagiosas variantes do SARS-CoV-2 detetadas no
Reino Unido, África do Sul e Brasil “suscitam preocupações”.
No documento, o ECDC apontou o “aumento substancial no número e
proporção de casos” da mutação do Reino Unido na UE/EEE, bem como que
estes países têm “notificado cada vez mais” casos da estirpe da África
do Sul.
Já a variante brasileira “está a ser notificada a
níveis mais baixos, possivelmente porque está principalmente ligada ao
intercâmbio de viagens com o Brasil”, adiantou o organismo na altura,
numa alusão à interrupção de viagens decretada por alguns países
europeus.
Recentemente, o Governo português decidiu prolongar até dia 16 de
março as medidas restritivas do tráfego aéreo, mantendo-se suspensos
todos os voos comerciais e privados com origem ou destino no Brasil e
Reino Unido.
Estirpe mais transmissível e ilude sistema imunitário
Essa estirpe detetada no Brasil, a P.1, poderá, no entanto, ter uma carga viral até dez vezes mais elevada e é capaz de iludir o sistema imunitário de quem já possuía anticorpos, revelam dois estudos preliminares.
“Provavelmente faz as três coisas ao mesmo tempo: é mais
transmissível, invade mais o sistema imunitário e, provavelmente, deve
ser mais patogénica”, disse esta terça-feira à agência espanhola EFE
Ester Sabino, professora da Faculdade de Medicina da Universidade de
São Paulo (USP) e coordenadora do grupo da USP que participou da
investigação realizada pelo Centro Brasil-Reino Unido para a Descoberta e
Diagnóstico de Abrovírus.
O estudo preliminar, realizado por investigadores brasileiros e
ingleses e divulgado na última sexta-feira, sugere que a nova variante
detetada no estado do Amazonas seja entre 1,4 e 2,2 vezes mais
transmissível do que as que a precedem e “provavelmente” isso é um dos
fatores responsáveis pela segunda vaga da pandemia do novo coronavírus
no Brasil.
Os cientistas também concluíram que a nova estirpe é capaz de evadir o sistema imunológico e causar uma nova infeção em parte dos indivíduos já infetados pelo SARS-CoV-2, concretamente entre 25 e 61%.
“Não se podem explicar tantos casos a não ser pela perda de imunidade”, disse Ester Sabino, que coordenou o estudo juntamente com o investigador Nuno Faria, da Universidade de Oxford.
O estudo preliminar, baseado num modelo matemático realizado pelo
Imperial College London, baseia-se na análise de genomas de 184 amostras
de secreção nasofaríngea de pacientes diagnosticados com covid-19 em
laboratórios de Manaus entre novembro de 2020 e janeiro de 2021.
A capital do Estado do Amazonas, Manaus, foi um dos focos da pandemia
no Brasil, quer na primeira, quer na segunda vaga da pandemia, e vive
um colapso da saúde desde o final do ano passado devido à explosão de
casos e de internações por covid-19.
A investigação, que teve apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do
Estado de São Paulo (Fapesp), ainda não foi revista por outros
cientistas ou publicada em revistas científicas, mas está disponível
online.
Da mesma forma, um outro estudo também divulgado na última
sexta-feira por investigadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) da
região amazónica indica que a carga viral no corpo de indivíduos
infetados com a P.1 pode ser até dez vezes maior.
O Brasil, um dos países mais atingidos pela pandemia no mundo,
acumula 10.587.001 infeções desde o registo do primeiro caso da doença,
em 26 de fevereiro do ano passado, e 255.720 mortes.
https://zap.aeiou.pt/variante-inglesa-brasil-ilude-imunitario-384625